A negativa de cobertura do medicamento Endobulin Kiovig® (Imunoglobulina g) pela Unimed deixou um jovem paciente, portador de imunodeficiência primária, sem tratamento adequado, agravando sua saúde e expondo os desafios enfrentados por muitos beneficiários de planos de saúde. Este caso, recentemente decidido pela Justiça, reforça a importância de buscar suporte jurídico para garantir os direitos de pacientes vulneráveis.
O que aconteceu no caso?
Um menino de apenas cinco anos foi diagnosticado com imunodeficiência de anticorpos com hiperimunoglobulinemia (CID D80.6), uma condição grave que compromete a capacidade do corpo de combater infecções. A situação era delicada e exigia reposição de imunoglobulina para fortalecer o sistema imunológico. Para isso, o médico responsável prescreveu o uso do Endobulin Kiovig®, a ser administrado em sessões regulares de pulso-terapia endovenosa ambulatorial.
Inicialmente, o tratamento foi realizado no Hospital Saha, credenciado pela Unimed. Contudo, após algumas sessões, a unidade foi descredenciada sem qualquer aviso prévio, deixando o paciente e sua família sem informações sobre alternativas equivalentes. Mesmo ciente da gravidade da condição do menino, a operadora não ofereceu um hospital com infraestrutura similar para dar continuidade ao tratamento.
Sem outra opção, a mãe do menino procurou auxílio jurídico e decidiu acionar a Justiça para garantir o direito do filho ao tratamento. Essa atitude foi crucial para assegurar que a criança recebesse a medicação necessária em um local adequado, dentro do padrão de qualidade previamente estabelecido.
Por que a Unimed recusou a cobertura de Endobulin Kiovig® (Imunoglobulina g)?
A justificativa da Unimed para não dar continuidade ao tratamento foi baseada em cláusulas contratuais. Segundo a operadora, o contrato previa que procedimentos deveriam ser realizados exclusivamente em sua rede credenciada, e, após o descredenciamento do Hospital Saha, o tratamento não poderia mais ser custeado no local.
Porém, essa postura ignorou direitos fundamentais do paciente previstos no Código de Defesa do Consumidor e na Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/98), que garantem a continuidade do atendimento em casos de descredenciamento de unidades, especialmente quando não há outra alternativa disponível.
A recusa de cobertura, segundo a Justiça, foi ainda mais grave porque a operadora não demonstrou que havia outro hospital ou profissional em sua rede capacitado para realizar o mesmo procedimento com o mesmo nível de qualidade. Isso configurou uma prática abusiva e prejudicial ao consumidor, agravando a saúde do menino e causando aflição emocional à família.
Decisão judicial: o que a Justiça determinou?
O caso foi analisado pela 8ª Vara Cível de Osasco, e a sentença reconheceu a abusividade na conduta da Unimed. A decisão enfatizou que a interrupção do tratamento colocou a vida do paciente em risco e violou direitos fundamentais, como o acesso à saúde e o respeito à dignidade humana.
A juíza responsável determinou que a Unimed deveria:
- Custear integralmente o tratamento com Endobulin Kiovig®, retomando as sessões no Hospital Saha, mesmo após o descredenciamento, até que fosse indicado outro local credenciado com estrutura equivalente;
- Pagar uma indenização por danos morais de R$ 15.000,00, devido à aflição e ao sofrimento desnecessário causados à criança e à sua família;
- Cumprir a ordem sob pena de multa diária de R$ 1.000,00, limitada ao valor total de R$ 100.000,00, em caso de descumprimento.
A sentença destacou que a negativa de cobertura ultrapassou os limites de um simples desacordo contratual. A recusa em garantir a continuidade do tratamento agravou o estado de saúde do menino e causou profundo abalo psicológico à família, caracterizando um dano moral inegável.
A importância de recorrer à Justiça
Para a família do menino, recorrer à Justiça foi a única forma de garantir que o tratamento prescrito pelo médico especialista fosse respeitado. O apoio de um advogado especializado em ações contra planos de saúde foi essencial para reverter a negativa de cobertura e assegurar que o menino recebesse os cuidados necessários.
Casos como este não são incomuns. Muitos consumidores enfrentam negativas de cobertura, seja para tratamentos prescritos, seja para medicamentos fora do rol da ANS. No entanto, como este caso demonstrou, essas recusas podem ser contestadas judicialmente com base no direito dos pacientes e nas garantias previstas em lei.
Direitos do consumidor e continuidade do tratamento
É fundamental que os consumidores saibam que possuem direitos claros e garantidos por lei. Entre eles, destaca-se o direito à continuidade do tratamento médico em casos de descredenciamento de unidades. O artigo 17 da Lei dos Planos de Saúde exige que as operadoras informem previamente seus clientes sobre mudanças na rede credenciada e ofereçam alternativas equivalentes para garantir que o atendimento não seja prejudicado.
Além disso, o tratamento off-label ou fora do rol da ANS também pode ser coberto quando há indicação médica e comprovação de sua eficácia para a condição do paciente.
Se você ou um familiar enfrenta dificuldades semelhantes, é crucial procurar orientação jurídica para entender seus direitos e tomar as medidas necessárias.
Conclusão
A sentença do processo nº 1021552-26.2018.8.26.0405, julgada pela 8ª Vara Cível de Osasco em outubro de 2020, reafirmou o direito do paciente à continuidade do tratamento com o medicamento Endobulin Kiovig®, mesmo após o descredenciamento do hospital onde o atendimento era realizado.
Proferida pela juíza Fernanda Cristina da Silva Ferraz Lima Cabral, a decisão condenou a Unimed a custear integralmente as sessões de pulso-terapia endovenosa, fixou multa de R$ 1.000,00 por dia em caso de descumprimento e determinou o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00.
Esta sentença, que ainda está sujeita a recurso, destaca a importância de assegurar os direitos dos consumidores e protege a dignidade de pacientes em situação de vulnerabilidade.