Uma recente decisão judicial destacou mais uma vez a importância da intervenção judicial em casos de negativa de cobertura por parte dos planos de saúde, especialmente em situações de extrema gravidade. O paciente em questão, diagnosticado com leucemia aguda bifenotípica, teve sua solicitação do medicamento Sprycel® (Dasatinibe) negada pela Unimed, mesmo com a prescrição médica detalhada que evidenciava a necessidade urgente do tratamento.
A negativa de cobertura: um obstáculo ao tratamento essencial
Logo após ser diagnosticado com leucemia em fevereiro de 2024, o paciente recebeu indicação dos seus médicos para iniciar o tratamento com Dasatinibe, um medicamento vital para controlar a doença e evitar o avanço para estágios mais graves. O remédio foi escolhido por suas características específicas de penetração no sistema nervoso central, o que é crucial para pacientes com leucemias agudas de alto risco, como era o caso. Além disso, apresentava um perfil de toxicidade mais favorável, o que poderia garantir uma melhor qualidade de vida ao enfermo.
Contudo, a Unimed recusou a cobertura sob a alegação de que o Dasatinibe (Sprycel®) não fazia parte do Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e que seu uso não estava previsto na bula. Alegar que um tratamento prescrito por um médico especialista não está no rol da ANS é uma prática frequente, mas abusiva, especialmente quando há evidências médicas sólidas sobre a necessidade do tratamento para a preservação da vida do paciente.
Tentativas frustradas de resolução amigável
Diante da negativa inicial, o paciente e sua família tentaram resolver o impasse diretamente com a operadora de saúde. Diversas tentativas de contato e envio de laudos médicos foram realizadas, mas a Unimed manteve sua posição de não fornecer o medicamento. A insistência na negativa prolongou o sofrimento do paciente, que necessitava iniciar o tratamento com urgência para conter o avanço da doença.
A frustração gerada por essa situação levou o segurado a procurar uma saída que garantisse seus direitos. Sem outra alternativa, ele recorreu a um advogado especializado em ações contra planos de saúde, buscando a proteção da Justiça para assegurar o tratamento adequado.
Ação judicial: uma luz no fim do túnel
Orientado por seu advogado, o paciente ingressou com uma ação cominatória contra a Unimed, solicitando que o plano fosse obrigado a fornecer o Sprycel® (Dasatinibe) de acordo com as dosagens prescritas pelos médicos responsáveis pelo seu tratamento. No processo, foram anexados relatórios médicos detalhados que explicavam claramente a gravidade do quadro e a razão da escolha do medicamento.
A ação judicial foi respaldada por argumentos sólidos: o medicamento estava devidamente registrado na Anvisa, a prescrição médica era clara e detalhada, e a negativa da Unimed baseava-se apenas na inexistência de previsão no Rol da ANS, algo que, segundo a Súmula 102 do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), não pode justificar a negativa de tratamento quando há expressa indicação médica.
A defesa da Unimed e sua tentativa de revogar a liminar
A Unimed contestou a ação, argumentando que a negativa de cobertura estava de acordo com as diretrizes da ANS e que o medicamento solicitado era “off-label”, ou seja, seu uso não estava devidamente especificado na bula para o tratamento da doença do paciente. Além disso, tentou revogar a liminar concedida anteriormente, que obrigava o fornecimento imediato do medicamento.
No entanto, o juiz responsável pelo caso entendeu que, diante da gravidade do quadro clínico e da prescrição clara feita pelos especialistas que acompanham o paciente, a negativa de cobertura era uma clara violação dos direitos do consumidor, garantidos pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). A argumentação da Unimed foi considerada desproporcional e abusiva, já que o medicamento estava disponível no mercado e tinha aprovação da Anvisa.
A decisão judicial favorável ao paciente
Em setembro de 2024, o Tribunal de Justiça de São Paulo julgou o caso, reconhecendo a ilegalidade da negativa da Unimed e determinando que o plano de saúde fosse obrigado a fornecer o Sprycel® (Dasatinibe) nas exatas dosagens prescritas pelos médicos. A decisão foi baseada na jurisprudência do TJSP, que já havia estabelecido em outras ocasiões que o fato de um tratamento não estar incluído no Rol da ANS não é motivo suficiente para que os planos de saúde recusem sua cobertura, especialmente em casos onde há risco de vida.
O magistrado destacou ainda que o tratamento solicitado era essencial para garantir a saúde e a vida do paciente. A Unimed, portanto, foi condenada a arcar com o fornecimento do medicamento durante todo o período necessário, além de pagar os honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa.
Essa decisão reforça a importância de se buscar auxílio jurídico quando os planos de saúde recusam a cobertura de tratamentos vitais. Em casos como este, onde há um claro conflito entre a prescrição médica e as diretrizes do plano de saúde, o rol da ANS não pode servir como desculpa para a recusa de um tratamento indicado por especialistas.
O que fazer em casos de negativa de cobertura?
Infelizmente, as negativas de cobertura por parte dos planos de saúde são uma realidade comum, especialmente quando o tratamento prescrito não se encontra no Rol da ANS ou é considerado off-label. No entanto, a Justiça tem se posicionado a favor dos consumidores, reconhecendo a abusividade dessas negativas quando há uma prescrição médica clara.
Para pacientes que enfrentam essas situações, o melhor caminho é buscar o auxílio de um advogado especialista em direito à saúde, que pode orientar quanto às medidas judiciais cabíveis. A liminar ou tutela de urgência pode ser uma ferramenta importante para garantir que o paciente não tenha que esperar pelo julgamento final para iniciar seu tratamento. Veja mais detalhes sobre a importância dessas medidas aqui.
Além disso, tratamentos que envolvem medicamentos fora do rol da ANS, como o Sprycel® (Dasatinibe), têm sido constantemente reconhecidos pela Justiça como passíveis de cobertura pelos planos de saúde. Saiba mais sobre o direito de acesso a tratamentos off-label neste artigo.
Informações do caso
O processo nº 1038803-89.2024.8.26.0100 foi julgado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em 16 de setembro de 2024, com decisão proferida pelo juiz Anderson de Oliveira Silva. A sentença obriga a Unimed a fornecer o medicamento Sprycel® (Dasatinibe) ao paciente, conforme as especificações médicas. A decisão ainda cabe recurso.